Reunidos no Salão Verde da Câmara dos Deputados, representantes de organizações sociais, membros de órgãos públicos, integrantes do governo e parlamentares lançaram oficialmente a Frente Nacional Contra o Trabalho Escravo e pela Aprovação da PEC 438, na última quarta-feira (4).
A proposta já foi aprovada em dois turnos no Senado e em primeiro turno no Plenário da Câmara Federal, em agosto de 2004. No mês passado, o presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP) recolocou a matéria na pauta, mas a votação em segundo turno depende ainda de um acordo entre os líderes para que efetivamente seja submetida à votação.
"Demos o primeiro passo, fomentando o clima para a votação e mostrando que há mobilização pela aprovação da PEC. Agora, temos que fazer corpo a corpo com os parlamentares", indica o deputado Paulo Rocha (PT-PA), presidente da Subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo, que integra a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público (CTASP).
Paulo Rocha, autor da primeira proposta (PEC 232/1995) com o mesmo conteúdo da PEC 438, conta que vem conversando com parlamentares refratários à proposta que fazem parte da bancada ruralista. Segundo ele, o grupo ligado a produtores rurais apresenta um argumento básico contra a chamada "PEC do Trabalho Escravo". Os ruralistas temem que a propriedade no campo seja colocada em risco, sob a justificativa de que a definição de trabalho escravo na lei em vigor não é muito clara.
A posição dos ruralistas não se justifica, na opinião de Jonas Ratier Moreno, titular da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete) do Ministério Público do Trabalho (MPT). "Não é verdade que o conceito de trabalho escravo não seja claro. O crime está muito bem definido no Art. 149 do Código Penal", assegura. "O trabalho escravo não é inventado. As pessoas estão lá jogadas em condições desumanas, em barracos de lona, bebendo água suja, etc.", destaca. "Não basta dizer que eles não estão lá porque querem. Esse tipo de postura já não cabe mais nos dias de hoje".
Além de contestar a "inconsistência" do que seria a condição análoga à escravidão, o procurador Jonas faz um apelo à bancada ruralista. "A aprovação da PEC seria uma resposta à altura aos questionamentos internacionais à produção agropecuária brasileira. Há acusações de que produtos podem estar ´sujos´ pela utilização de mão-de-obra escrava. A adoção da emenda seria um sinal claro de que ninguém no Brasil compactua com esse tipo de crime praticado por uma parcela minoritária de fazendeiros".
"O produtor que cumpre a legislação não tem nada a temer", acrescenta Jonas, que atua na Procuradoria Regional do Trabalho (PRT) da 24ª Região, no Mato Grosso do Sul. "Quem deve temer a aprovação da PEC são os bandidos, que continuam explorando pessoas de forma criminosa".
O coordenador do combate à escravidão dentro do MPT sublinha, porém, que a maioria dos deputados manifesta apoio à causa. "Por enquanto, essa disposição está no nível da promessa. Queremos que isso se reflita na votação no Plenário", pressiona. O deputado Paulo Rocha, por sua vez, afirma que a Frente está "sintonizada" com a pauta do Plenário e que a matéria só deve ser submetida à votação quando houver condições efetivas de aprovação. Os esforços, projeta, serão canalizados para culminar na agenda de votações da última semana deste mês.
Segunda abolição
Artistas do MHuD (Movimento Humanos Direitos) leram o manifesto à nação pela aprovação da PEC do Trabalho Escravo no Salão Verde da Câmara. Logo em seguida, os manifestantes seguiram para a Sala 13, da Ala Alexandre Costa, no Senado Federal. Também marcaram presença no ato de lançamento da Frente outros deputados federais como Chico Alencar (PSol-RJ), Adão Pretto (PT-RS), Flávio Dino (PCdoB-MA) e Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ). O senador José Nery (PSol-PA), um dos principais articuladores da iniciativa, esteve acompanhado de colegas como Serys Shlessarenko (PT-MS) e Eduardo Suplicy (PT-SP). A secretária de Justiça e Direitos Humanos do Pará, Socorro Gomes, também compareceu, além de integrantes de diversos outros órgãos.
Também na quarta-feira a CNBB divulgou uma nota oficial sobre a importância da aprovação da PEC do Trabalho Escravo. "Se o desrespeito à função social da propriedade da terra já é, segundo a Constituição, motivo suficiente para sua possível desapropriação, o uso da propriedade como instrumento para escravizar o próximo é crime absolutamente intolerável contra a dignidade e contra a vida. Nada mais justo que os que praticam esse crime venham a perder sua propriedade, sem compensação, para que o Estado lhe dê destinação apropriada, especificamente, para a reforma agrária!", diz o texto assinado pelo presidente, pelo vice-presidente e pelo secretário-geral da entidade, respectivamente, Dom Geraldo Lyrio Rocha, Dom Luiz Soares Vieira e Dom Dimas Lara Barbosa.
"São 120 anos da abolição da escravidão no Brasil, 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O tempo é propício para se decretar a segunda abolição da escravidão no campo brasileiro por meio da aprovação desta PEC", prossegue a nota da entidade. "Confiamos no espírito público do Congresso Nacional, no senso de justiça e de valorização da pessoa humana de nossos Parlamentares. A aprovação da PEC 438/2001 será uma excelente contribuição para que seja varrida de nosso horizonte uma vergonha que tanto desonra o Brasil".
Fonte: Repórter Brasil
Disponível em: http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=38416
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